A síndrome mielodisplásica, também chamada de mielodisplasia ou SMD, é um grupo de distúrbios do sangue caracterizado pela incapacidade das células tronco da medula óssea de se desenvolverem em células sanguíneas maduras e funcionais. A síndrome mielodisplásica é uma doença predominantemente de indivíduos idosos e se apresenta clinicamente com anemia e queda no número de glóbulos brancos e plaquetas. Uma das principais complicações da mielodisplasia é a sua transformação em leucemia.
Neste artigo vamos abordar os seguintes pontos sobre a mielodisplasia:
- O que são as células do sangue.
- Como funciona a medula óssea.
- O que é síndrome mielodisplásica.
- Causas da síndrome mielodisplásica.
- Sintomas da síndrome mielodisplásica.
- Diagnóstico da mielodisplasia.
- Tratamento da mielodisplasia
O que são as células do sangue
Para entender a mielodisplasia é preciso antes saber o que são as células sanguíneas e o que é a medula óssea. Serei sucinto nesta explicação para não cansar o leitor com termos técnicos e funções fisiológicas.
As células do sangue são dividas em três linhagens:
1. Hemácias (também conhecida como glóbulos vermelhos)
As hemácias são as células que transportam oxigênio através do sangue. A queda no número de hemácias se chama anemia. Sua principal consequência é a diminuição na capacidade do organismo de levar oxigênio adequadamente para suas células e tecidos (leia: ANEMIA | Sintomas e causas).
2. Leucócitos (também conhecido como glóbulos brancos)
Os leucócitos são células do sistema imunológico que agem defendendo o nosso organismo contra germes invasores, como bactérias, vírus, parasitas e fungos. A queda no número de leucócitos se chama leucopenia. Sua principal consequência é tornar o organismo mais susceptível a infecções.
3. Plaquetas
As plaquetas fazem parte do sistema de coagulação, sendo as responsáveis pela primeira parte do estacamento de qualquer sangramento. A queda do número de plaquetas chama-se trombocitopenia. Sua principal consequência é a diminuição da capacidade do organismos em conter sangramentos.
Se você quiser saber mais detalhes sobre hemácias, leucócitos e plaquetas, leia o seguinte artigo: HEMOGRAMA | Entenda os seus resultados..
Como funciona a medula óssea
A medula óssea, chamada popularmente de tutano, é uma estrutura que fica localizada no interior dos grandes ossos, sendo a responsável pela produção das células sanguíneas. A medula óssea produz células-tronco, que são células precursoras, capazes de se transformar em células maduras e funcionais.
A célula tronco, de acordo com o estímulo a que for exposta, pode se diferenciar em qualquer tipo de célula sanguínea, sejam plaquetas, hemácias ou qualquer um dos tipos de leucócitos (linfócitos, neutrófilos, eosinófilos, etc.). Portanto, todas as células circulantes em nosso sangue tiveram origem em um célula-tronco da medula óssea.
A medula óssea funciona continuamente, produzindo células, de forma a manter sempre estável o número de hemácias, leucócitos e plaquetas no sangue. As células sanguíneas velhas são destruídas no baço, órgão localizado no quadrante superior direito do abdômen, e são substituídas pelas células novas recém-produzidas na medula óssea.
Uma hemácia tem uma vida média de 120 dias, os leucócitos vivem cerca de 20 dias e as plaquetas apenas 10 dias. Depois que atingem essas idades, as células são retiradas da circulação pelo baço.
O que é mielodisplasia
“Mielo” é um termo de origem grega que significa medula óssea, e displasia é um termo usado para descrever anomalias estruturais. Portanto, grosso modo, mielodisplasia significa anomalia da medula óssea.
Síndrome mielodisplásica é o nome dado para descrever um grupo de doenças que se caracteriza por uma medula óssea doente, cheia de células-tronco displásicas, incapazes de gerar células maduras e funcionantes. Essas células-tronco doentes se comportam como um câncer, pois são clones que se multiplicam indefinidamente, ocupando espaço na medula onde deveriam haver células sadias.
Em geral, as células-tronco defeituosas costumam ter um dos seguintes destinos:
– Morrem dentro da medula óssea antes de se diferenciarem.
– Conseguem formar células jovens (blastos), mas morrem assim que são lançadas na circulação sanguínea.
– Conseguem formar células jovens (blastos), mas elas não conseguem se maturar, sendo incapazes de exercer as funções das células sanguíneas maduras.
– Conseguem chegar à forma madura, mas são células defeituosas, que não funcionam adequadamente.
Independente do destino da célula-tronco displásica, o resultado final é uma produção insuficiente de células sanguíneas sadias.
A mielodisplasia é uma doença progressiva. Inicialmente apenas uma fração das células-tronco se tornam defeituosas, sendo incapazes de se diferenciar e se tornar células maduras. Com o tempo, esses clones se proliferam, e um número cada vez maior de células displásicas vão surgindo, até o ponto em que a quantidade de células doentes é maior que o de células sadias.
O resultado final desta insuficiente produção de hemácias, leucócitos e plaquetas saudáveis pela medula óssea é a redução progressiva da sua quantidade no sangue, levando à anemia, leucopenia e trombocitopenia.
Causas da síndrome mielodisplásica
A síndrome mielodisplásica surge quando algum fator age provocando mutações nas células-troncos da medula óssea, tornado-as defeituosas e incapazes de gerar células sanguíneas maduras e funcionais. Na maioria dos casos, esse fator desregulador é desconhecido.
Costumamos dividir as síndromes mielodisplásicas em dois grupos de acordo com sua origem: mielodisplasias primárias e mielodisplasias secundárias.
As mielodisplasias primárias são aquelas que não conseguimos identificar um agente causador das alterações medulares. O paciente desenvolve a SMD sem que haja uma causa clara para o fato. Cerca de 70% dos casos de mielodisplasia são primários.
As mielodisplasias secundárias são aquelas que surgem após a exposição a determinadas substâncias tóxicas para a medula óssea, habitualmente radiação e quimioterapia. Pacientes que durante a sua vida foram tratados para cânceres, como leucemias, linfomas, câncer de mama, etc., podem anos depois, desenvolverem síndrome mielodisplásica.
Entre os quimioterápicos relacionados ao aparecimento da síndrome mielodisplásica, podemos citar:
- Clorambucil.
- Ciclofosfamida.
- Doxorrubicina.
- Etoposídeo.
- Ifosfamida.
- Mecloretamina.
- Melfalano.
- Procarbazina.
- Teniposídeo.
Pessoas expostas durante a vida a químicos tóxicos como inseticidas, agrotóxicos, fertilizantes, mercúrio, chumbo e benzeno. Pessoas fumantes também apresentam um maior risco de desenvolverem SMD (leia: DOENÇAS DO CIGARRO | Como parar de fumar).
As formas secundárias costumam ser as mais resistentes ao tratamento.
Sintomas da síndrome mielodisplásica
A síndrome mielodisplásica é uma doença que acomete, habitualmente, pessoas acima dos 60 anos, sendo rara em indivíduos com menos de 50 anos. Homens são mais acometidos que mulheres.
Nos estágios iniciais da doença, enquanto a queda do número de células for pequena, o paciente não sente sintoma algum. Nestes casos assintomáticos, a mielodisplasia pode ser suspeitada através do exame de sangue hemograma, que já é capaz de detectar pequenas redução de uma ou mais das 3 linhagem de células sanguíneas.
Conforme a doença avança, o paciente passa a apresentar sintomas decorrentes da redução do número de hemácias, leucócitos e plaquetas.
A redução das hemácias é chamada de anemia e provoca sintomas como cansaço, falta de energia, palidez da pele, palpitações e falta de ar (leia: 7 SINTOMAS DE ANEMIA).
A redução no número de leucócitos, chamada leucopenia, diminui a capacidade do organismo de lutar contra germes invasores. Dentro do grupo dos leucócitos, os neutrófilos costumam ser o tipo que mais apresenta queda na sua produção. A neutropenia (baixo número de neutrófilos) predispõe o paciente a infecções bacterianas, principalmente sinusite, pneumonia e infecções urinárias ou da pele.
A queda do número de plaquetas, chamada trombocitopenia, faz com que o paciente tenha maior dificuldade de coagular o sangue. Clinicamente isso se manifesta como uma maior facilidade de surgirem equimoses (manchas roxas na pele), sangramentos nasais e gengivais. Em fases mais avançadas, com níveis de plaquetas muito baixos, o paciente pode apresentar hemorragias espontâneas, principalmente do trato gastrointestinal.
Uma das complicações mais temidas da SMD é a sua transformação em leucemia mieloide aguda (leia: LEUCEMIA | Sintomas e Tratamento).
Diagnóstico da mielodisplasia
Habitualmente, a hipótese diagnóstica de síndrome mielodisplásica surge após um hemograma que evidencia diminuição do número de uma, duas ou das três linhagens de células sanguíneas. Se a doença ainda estiver em fases iniciais, geralmente, ainda só há redução em um dos três tipos de células.
Além de identificar um número reduzido de células, o hemograma também é capaz de nos informar a morfologia das mesmas, podendo indicar a presença de células displásicas no sangue.
Havendo a suspeita de mielodisplasia, o próximo passo é obter amostras da medula óssea para avaliação. O exame é feito em duas
partes:
– Aspirado de medula óssea: procedimento em que se aspira através de uma agulha uma amostra do líquido existente na medula.
– Biópsia de medula óssea: procedimento em que se coleta um pequeno fragmento de osso, contendo a medula óssea.
Ambos os materiais obtidos são levados a um patologista que consegue identificar a presença de displasia medular e mutações cromossomiais.
Tratamento da síndrome mielodisplásica
A SMD é uma doença de progressão lenta. Como ela acomete preferencialmente idosos, muitas vezes, um tratamento agressivo pode acabar fazendo mais mal do que a própria doença.
Se o grau de anemia, trombocitopenia ou leucopenia for leve, tratamento de suporte visando apenas a correção destes valores pode ser o mais indicado. Drogas como a eritropoietina estimulam a produção de hemácias pela medula e podem ajudar a corrigir anemias. Para aumentar a contagem de leucócitos, drogas como o Granulokine (G-CSF) são úteis.
Em alguns casos mais graves são necessárias transfusões de hemácias ou de plaquetas para repor a falta destas.
A quimioterapia para destruição das células displásicas pode ser utilizada em alguns casos. As drogas mais usadas são a Decitabina, Lenalidomida e a Azacitidina.
Transplante de medula óssea para o tratamento da mielodisplasia
Só existe um tratamento que cura a síndrome mielodisplásica: o transplante de medula óssea. O problema é que o transplante de medula óssea é um procedimento de alto risco, não sendo seguro se o estado geral do paciente não for muito bom. Em geral, o transplante só é indicado em casos graves, sem resposta aos tratamentos convencionais.
Antes do transplante, o paciente é submetido a doses elevadas de quimioterapia, de forma a destruir todas as células da sua medula óssea. A medula e suas células displásicas são totalmente eliminadas do corpo. Nesta fase que precede o transplante, o paciente fica completamente exposto a infecções, pois, sem medula, ele é incapaz de produzir leucócitos para sua defesa.
Uma vez aniquilada toda a medula óssea do organismo, o paciente recebe uma transfusão com sangue rico em células-tronco de um doador compatível, geralmente um familiar. Essas células-troncos sadias preenchem a medula destruída e passam a produzir células sanguíneas saudáveis.
Como a SMD é uma doença que acomete predominantemente pessoas idosas, muitas delas não tem condições clínicas de se submeterem ao transplante de medula óssea.
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